Zélio de Moraes

A história da Umbanda começa quando Zélio Fernandino de Moraes, um jovem com 17 anos de idade do Rio de Janeiro, prestes a ingressar na Marinha, começou a ter comportamentos estranhos que a família chamava de “ataques”. Zélio ficava com a postura de um idoso, dizia coisas incompreensíveis para a família, parecendo ter vivido em outras épocas e demonstrando profundo conhecimento da natureza.

Zélio foi levado para o médico da família que aconselhou que ele fosse atendido por um padre, pois considerava o rapaz “possuído”. Um familiar sugeriu que ele fosse levado a um centro espírita, e assim, no dia 15 de novembro, Zélio foi convidado a sentar-se à mesa da sessão da Federação Espírita de Niterói, presidida à época por José de Souza.

Tomado por uma força desconhecida, Zélio interrompeu a sessão dizendo “Aqui está faltando uma flor”, foi até o jardim e retornou segurando uma rosa branca, que a deixou no centro da mesa, provocando alvoroço. Logo em seguida, vários médiuns começaram a manifestar espíritos de indígenas e negros escravos.

Diante disso, o diretor dos trabalhos, julgando se tratarem de espíritos de baixa evolução espiritual, conforme a forma de pensar da época, convidou os espíritos a se retirarem. Zélio, ainda domando pela estranha força, respondeu:

Por que repelem a presença desses espíritos, se nem sequer se dignaram a ouvir suas mensagens? Será por causa de suas origens sociais e da cor?

Seguiu um debate, onde procurava-se doutrinar o espírito mas ele respondia com argumentação segura e sobriedade. Até que um médium o indaga:

Afinal, porque o irmão fala nesses termos, pretendendo que esta mesa aceite a manifestação de espíritos que, pelo grau de cultura que tiveram quando encarnados, são claramente atrasados? E qual é o seu nome, irmão?

Ao qual o espírito respondeu:

Se querem um nome, que seja este: sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque para mim não haverá caminhos fechados. O que você vê em mim são restos de uma existência anterior. Fui padre e o meu nome era Gabriel Malagrida. Acusado de bruxaria, fui sacrificado na fogueira da Inquisição em Lisboa, no ano de 1761. Mas em minha última existência física, Deus concedeu-me o privilégio de nascer como Caboclo brasileiro.

E finalmente, completou sobre sua missão:

Se julgam atrasados esses espíritos dos negros e dos índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho para dar início a um culto em que esses negros e esses índios poderão dar a sua mensagem e assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem o meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminho fechado para mim.

Reunião dos dirigentes das Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, presidida por Zélio de Moraes na TENSP.

No dia seguinte, a casa de Zélio recebia parentes, amigos, vizinhos e membros da Federação Espírita, e uma multidão se reunia fora. O Caboclo das Sete Encruzilhadas manifestou-se as 20h e declarou o início de uma nova religião, ao qual chamou de “Umbanda” e seria motivada por princípios evangélicos e pela prática da caridade, onde os espíritos de índios e negros escravos, que não encontravam campo de atuação nos cultos existentes, poderiam trabalhar em prol dos irmãos encarnados, independentemente de cor, raça, condição social e credo.

O caboclo definiu que os cultos deveriam ser das 20h as 22h, com atendimento gratuito e participantes uniformizados de branco. O grupo que fundou naquela noite recebeu o nome de Nossa Senhora da Piedade, pois acolheria os que buscavam ajuda e conforto. Após ditar as normas, o caboclo respondeu a perguntas em latim e alemão formuladas por sacerdotes ali presentes. Iniciados os atendimentos, foram operadas diversas curas, inclusive a de um paralítico.

Dona Zilméia, a última dos quatro filhos de Zélio a retornar para a pátria espiritual em 16/09/2010.

Desde então, o Caboclo das Sete Encruzilhadas dedicou-se a esclarecer e divulgar a Umbanda, e recebendo ordens da Espiritualidade, fundou em 1918 sete novas tendas:

  • Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia
  • Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição
  • Tenda Espírita Santa Bárbara
  • Tenda Espírita São Pedro
  • Tenda Espírita Oxalá
  • Tenda Espírita São Jorge
  • Tenda Espírita São Gerônimo.

Ao longo de toda a sua vida, Zélio nunca fez da missão espiritual uma profissão, sempre contribuindo com parte de seu salário para a manutenção das tendas, além de ajudar os que se albergavam em sua casa. Por orientação do caboclo, não aceitava cheques e presentes.

Zélio Fernandino de Moraes retornou a pátria espiritual aos 84 anos, em 03 de outubro de 1975, deixando esposa e filhas (Zélia e Zilméia) a frente da Cabana de Pai Antônio, e já se contabilizava mais de 10.000 templos abertos em todo o país.

 


JÚNIOR BARBOSA, ADEMIR. Curso Essencial de Umbanda. São Paulo: Universo dos Livros Editora Ltda, 2011.